quarta-feira, 30 de agosto de 2017

VISA POUR L'IMAGE 2017

FESTIVAL INTERNACIONAL DE FOTOJORNALISMO EM PERPIGNAN

" O autêntico Fotojornalismo está cada vez sendo menos utilizado pela grande imprensa
   mas asseguro que nunca vai morrer, porque serão sempre necessários fotógrafos para
   testemunhar tudo o que se passa no mundo. Não é o Fotojornalismo que está condenado é
   a imprensa que não faz o seu trabalho"
                                            Jean François Le Roy
As melhores imagens do Fotojornalismo em 2017 estarão expostas em Perpignan no Sul Da França no Visa Pour L'Image em sua 29a edição. O Festival acontece em vários pontos da cidade onde exposições, debates, projeções, encontros, palestras, feiras serão realizadas com a presença dos maiores fotojornalistas de todo o mundo.  
Photo by Álvaro Canovas all rights reserved
 
A primeira edição foi em 1989 e tem se repetido ano após ano, sempre no final de agosto e início de setembro. A abertura este ano vai ser no dia 02 de setembro e ficará até dia 17 de setembro de 2017. De 18/09 até dia 22/09/2017 as exposições serão dedicadas somente a estudantes previamente agendados.
Photo Laurent Van der Stockt all rights reserved
 
A exposições são o ponto alto do Festival e dentre as inúmeras mostras podemos destacar a cobertura da Batalha de Mossoul no Iraque para combater o ISIS, o Estado Islâmico com três olhares diferentes dos fotojornalistas  Laurent Van der Stockt para o Le Monde , Álvaro Canovas para o Paris Match e Lorenzo Meloni para a Magnum Photos. A última edição do World Press Photo também vai participar do Visa. 
Jean François Le Roy o fundador de Festival acredita que a insistência  em mostrar através de fotografias os horrores de uma guerra deve ser repetida até a exaustão, para que as pessoas que fingem não acreditar só assim possam algum dia ficar convencidas.

domingo, 13 de agosto de 2017

UM REVEILLON NO JACAREZINHO

NA ERA DO KOJAK UM FINAL DE ANO PRA NINGUÉM BOTAR DEFEITO
            Alô, alô W/Brasil, Jacarezinho, avião, Jacarezinho, avião
            Cuidado com o Disco Voador
                         W/Brasil (Chama o Síndico) Jorge Bem Jor
NÃO SE ENTRA EM UMA FAVELA À NOITE SEM TER SIDO CONVIDADO
Era o final do ano da graça de 1988, estávamos à beira de um Ano Novo cheio de esperanças, o Ano de 1989 seria um ano de muitas realizações e era preciso celebrar sua chegada. Eu trabalhava na equipe fotográfica do Jornal O Dia , carregava comigo a experiência de haver trabalhado em dois grande jornais, O Globo e o Jornal do Brasil e tinha a fama de ser um especialista em favelas, após a temporada na Rocinha, que rendeu uma reportagem histórica para o JB. Haviam esquecido que eu havia também sido rotulado como um "fotógrafo de coluna social", pelos três ou mais anos cobrindo a vida noturna e as socialites da cidade na época de ouro do colunismo social. Mas jornalismo é assim mesmo (ou era). As equipes para a grande cobertura de final de ano haviam sido escaladas, eu, era considerado  um "profundo" conhecedor dos meandros das favelas cariocas e fui premiado com a tarefa de passar o réveillon no meio do tiroteio. Na Favela do Jacarezinho, um dos redutos do Comando Vermelho, na época sob o reinado do Kojac, o dono do morro.
Olheiro foto Alcyr Cavalcanti all rights reserved

Sabiamente perguntei aos chefes se estava tudo combinado, afirmaram com um sonoro " Sim, claro que sim". Mas eram apenas palavras ao vento, nada havia sido combinado, seria apenas para "não ficarmos intimidados, com medo da matéria". A experiente repórter que teria sido o contato, havia se esquecido, ou parece ter se esquecido. Fomos então todo contentes para a inglória missão, que provavelmente poderia render uma capa e um destaque no jornal.
Mais do que nunca a velha máxima "Não se entra em uma favela sem ter sido convidado ou sem ter um destino certo" seria aplicada. Ao chegarmos na favela, em torno de dez da noite fomos direto para a praça principal, acho que Largo da Concórdia  (sic) que estava  deserta, um clima um pouco estranho. Estavam preparando um coreto para um baile e as comemorações. A repórter Angelina, o motorista e eu desembarcamos de uma Kombi  caindo aos pedaços  sem a logomarca do jornal,  e o motorista "malandro agulha" a toda hora usava o radio comunicador para "tirar uma onda". Ao pressentir que a acolhida não iria ser nada amistosa tive a brilhante (e única) ideia de encontrar a matriarca local e saímos a procurar.  Batemos em uma casa e nada encontramos, ninguém queria falar, nem matriarca, nem patriarca nem criança, estávamos abandonados á própria sorte. Aos poucos o tempo ia passando, em um beco as caixas de som iam chegando, o palco para os festejos estava quase pronto. Fogos começavam a espocar e alguns tiros também. Faltavam quinze minutos para a meia noite, um novo ano pleno de esperanças ia começar, e começou. De vários becos em plena escuridão, de repente sai uma tropa de uns trinta jovens não com foguetes e bombinhas comemorativas, mas com fuzis, pistolas e vem aos gritos em nossa direção, : "Que porra é essa, guarda esse troço"  em relação à minha velha Nikon. Fiquei petrificado, sem ação enquanto um deles apontava sua arma o outro fez um sinal negativo para mim e foi direto ao rádio comunicador, privilégio de policiais e jornalistas, e foram diretos a nos acusar de X-9. Meio gagos e trêmulos dissemos a um dos jovens soldados que éramos do Dia e estava tudo combinado com o Kojak, mas eles deram um sorriso estranho e disseram que nada havia sido passado a eles e que o tal Kojak não mandava nada e após uma pequena confabulação  disseram para ir embora, "vazar" com muita rapidez sempre com as "peças" bem carregadas apontadas para nós. . O Kojak das Joias como era conhecido tinha conseguido levar a Escola de Samba Unidos do Jacarezinho para o Grupo Especial no Carnaval 1988. Ao que parece já havia uma cisão no movimento e  Kojak era a "bola da vez", foi executado e arrastado como um animal pela favela um tempo depois, mas quem havia ficado na redação não sabia nada de Jacarezinho, ou esqueceu que nas mais de 950 favelas da bela cidade de São Sebastião o movimento é extremamente móvel, e tudo muda com muita rapidez e como diria um cientista social de gabinete "A correlação de forças mudou", mas em realidade "no Jacaré o buraco é mais embaixo".
Claro que após a recepção nada amistosa, entramos na Kombi e fomos embora, aparentando calma, a essa altura estávamos congelados de medo, a repórter Angelina estava paralisada no banco de trás e balbuciava frases desconexas. Ao sair vagarosamente a dez km ainda tive a infeliz ideia de falar a um dos rapazes que se preparava para botar as caixas de som a mil decibéis se podia tirar uma foto do grupo, e respondeu simplesmente apontando para uma arma que estava em sua cintura e notei que logo atrás dois soldados estavam na contenção. Só então caímos na realidade que era sumir dali o mais rápido possível e fomos á procura inglória de um bar para baixar o nível de stress, mas era tudo um deserto só, as pessoas ou estavam trancados em suas casas a festejar, ou todos na Praia de Copacabana na saudação à Rainha do Mar. Fomos cada um de volta para casa completamente mudos e rezando para que o ano que começava fosse um pouco melhor do aquela noitada imensamente mal sucedida. Mas, pensando bem se fosse hoje, nos novos tempos envelhecidos do século XXI, não estaria aqui a contar como se faz uma reportagem, ou melhor como não se deve fazer a reportagem de um Réveillon no Jacarezinho.